Não faz muito tempo que o conceito de Internet das Coisas, ou Internet of Things (IoT), gerava inúmeras expectativas sobre suas possíveis aplicações. Entre geladeiras que apontam o momento de fazer uma nova visita ao mercado, até lâmpadas que mudam de cor de acordo com o gosto do consumidor, foram poucas as ideias que caíram no gosto popular. “Naquela época, tínhamos uma solução em busca de um problema”, afirma David de Paulo Pereira, distinguished analyst da TGT ISG e autor do novo estudo “ISG Provider Lens Internet of Things – Services and Solutions 2023”.
No entanto, organizações e setores estão encontrando usos mais apropriados para a tecnologia. Depois de muitos testes e amadurecimento do conceito, espera-se que até 2027 o mundo tenha mais de 29 bilhões de dispositivos conectados à rede, segundo dados do IoT Analytics. Parte desse desenvolvimento se dá à baixa latência – ou seja, menor tempo de resposta para um comando – oferecida pela tecnologia 5G, que completou um ano de implantação no Brasil em julho.
IoT na prática
Segundo o estudo, a tecnologia abriu caminho para diversos casos de uso que, até então, eram limitados pelas redes 4G. “Algumas frações de segundo podem mudar drasticamente o que o sensor está querendo dizer”, afirma Pereira. O autor dá o exemplo do uso de IoT em salas de cirurgia, onde qualquer alteração que aconteça no corpo do paciente pode demandar reações imediatas.
Nos Estados Unidos, país com acesso à rede 5G há mais tempo e em maior escala por exemplo, a IoT vem sendo amplamente utilizado na indústria e na confecção de carros autônomos. Já na Alemanha o conceito vem sendo aplicado no setor logístico do país, até mesmo com o uso de caminhões autônomos – como é o caso da empresa sueca Einride, que lançou seu caminhão sem motorista no país em 2022.
Já no Brasil, além da aplicação do IoT na indústria, há diversos casos de uso na agricultura com potencial para ampliação. “Sensores conectados à Internet têm a capacidade de enviar dados em tempo real para um sistema centralizado, o qual pode ser acessado por meio de um aplicativo móvel ou de desktop”, explica Pereira. “Dessa maneira, os agricultores podem acompanhar a umidade do solo, a temperatura e outros fatores essenciais em tempo real, ajustando assim a quantidade de água fornecida às plantas com base nessas informações. Isso contribui para a preservação da água, a redução de despesas e a melhoria da qualidade das colheitas”.
A EMBRAPII (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial), por exemplo, em parceria com a Piscis e o Sebrae, anunciou o lançamento de um sistema de sensoriamento que permite identificar as oscilações das condições que cativeiros para a criação de camarões no polo de inovação do Instituto Federal do Ceará (IF-CE). Uma vez que a qualidade do ambiente onde o animal é criado e a qualidade do pescado estão relacionados com a qualidade da água, o monitoramento se torna essencial.
Uma combinação de sucesso
O estudo também aponta que a Inteligência Artificial (IA) unida à Internet das Coisas pode gerar grandes ganhos de eficiência para as organizações, uma vez que, juntas, diminuem a complexidade e a demanda por capacidade de processamento. Sem a dependência da intervenção humana nos processos, a IA aliada ao IoT é capaz de ampliar a eficiência operacional, administrar riscos e contribuir na tomada de decisão. “Uma das formas de aplicação de IA está na identificação de padrões de comportamentos – seja de pessoas ou de equipamentos – e, mais importante, quando saem do padrão”, aponta o autor.
Como exemplo, ele explica a possibilidade de identificar se um colaborador fez o login no sistema de trabalho à distância em um horário fora do comum, o que pode indicar uma tentativa de invasão no sistema da empresa. Ou então, se um equipamento industrial está funcionando de maneira atípica, o que pode demandar uma avalição técnica para não comprometer a máquina. “A IA tem sido usada para otimizar o consumo de energia, a segurança, a manutenção e a gestão dos dispositivos IoT, além de habilitar novas funcionalidades, como reconhecimento facial, voz e imagem”.
Outro aliado de peso é a edge computing, ou computação de ponta, que oferece uma arquitetura favorável à redução de custos, de consumo de energia e nos ganhos de eficiência. Isso porque várias das informações que, sem a tecnologia, precisariam ser processadas e analisadas em um computador centralizado, podem ser pré-analisadas junto aos sensores de IoT.
Desafios para IoT
Com novos avanços nas tecnologias emergentes, também crescem as preocupações relacionadas a cibersegurança e proteção de dados dado o aumento de ataques cibernéticos. A regra é o conceito do Zero Trust, ou seja, assumir que nenhuma conexão ou dispositivo é seguro no momento de criar conectividade em IoT.
“Aprimorar a infraestrutura visando sustentar e gerenciar um amplo fluxo de dados e conexões simultâneas coloca um desafio técnico diante de nós. Integrar e possibilitar a troca de informações entre dispositivos e plataformas originárias de diferentes fabricantes pode revelar-se complexo em virtude da ausência de padronização”, explica Pereira. “Além disso, garantir uma conectividade confiável para diversos tipos de dispositivos IoT, os quais podem estar localizados em áreas remotas ou em movimento, também é um aspecto crucial. Nesse contexto, a tecnologia 5G pode desempenhar um papel fundamental”.
Para as fornecedoras de dispositivos e ferramentas IoT, há ainda desafios de integração – uma vez que seus produtos e serviços, que são proprietários, devem se conectar a plataformas e equipamentos de outras empresas – e de escassez de mão de obra capacitada na tecnologia.
IoT em construção
Por mais que as aplicações de IoT não sejam mais a das geladeiras inteligentes, há inúmeros casos de uso que estão sendo testados e aplicados com sucesso. É o caso, por exemplo, em medições de emissões de gases de efeitos estufa, que ajudam organizações e indústrias a tomar decisões sobre como podem impactar positivamente o meio ambiente. Segundo o autor, ferramentas de IoT podem monitorar diferentes parâmetros, contribuindo com a redução de energia e das emissões. “Se a empresa não fizer esse monitoramento, a boa intenção de ESG ficará apenas no papel”, afirma Pereira. “Quando utiliza IoT, essa intenção pode se tornar realidade.”
Para o consumidor final, uma área que vem utilizando com cada vez mais frequência soluções de IoT é a dos condomínios. Em um exemplo, prédios residenciais estão aplicando ferramentas de reconhecimento facial para autorizar a entrada de moradores e visitantes cadastrados no sistema do condomínio. Dessa forma, a segurança é ampliada de forma prática e pouco percebida pelos moradores.
“No final do dia, esperamos que IoT se traduza em bons serviços para as pessoas”, diz David de Paulo. Isso pode se desdobrar tanto em alimentos com maior qualidade, mais segurança no trabalho e em casa, e até nos atendimentos hospitalares.
Fonte: Consumidormoderno.com.br